Um filme perturbante que retrata a américa dos anos 50
através da vida de Frank e April Wheeler, baseado no livro com o mesmo título
de Richard Yates. Em 1955 o casal Wheeler vive o sonho americano tal qual é
publicitado pela indústria de electrodomésticos norte americana: April é dona de casa e mãe de dois filhos pequenos, habitando com
Frank uma linda casa nos subúrbios em Connecticut. Frank trabalha no escritório
de uma empresa em Nova York, para onde viaja todos os dias de comboio, a par de
centenas de homens vestidos de igual que enchem diariamente o comboio e as
estações. Aos olhos da comunidade os Wheeler são o casal perfeito: bonitos,
jovens e talhados para o sucesso. Contudo, o sentimento deste casal não é o de
felicidade. Frank arrasta-se no seu emprego, quebrando ocasionalmente a
monotonia com a sedução de uma colega de escritório. April, após ter falhado
numa carreira enquanto atriz sente-se presa a uma vida estereotipada e sem
surpresas numa gaiola dourada. É April quem primeiro verbaliza a insatisfação
que a consome sugerindo ao marido uma vida de aventura rumo a Paris, onde April
seria o ganha pão do casal como secretária ao serviço de uma organização
internacional, permitindo a Frank ter tempo disponível para descobrir a sua
vocação. Gradualmente a ideia ganha a concordância e o entusiasmo de Frank e o
casal decide contar aos amigos mais próximos o plano de mudança de continente.
A partir desse momento tudo se precipita.
Curioso é o processo mental algo dessincronizado dos Wheeler
e dos restantes amigos do casal. Os primeiros espelhando a felicidade e a
liberdade de quem está prestes a deixar para trás uma vida cinzenta e sem
brilho, os segundos, inicialmente cépticos, experimentando um sentimento de
superioridade por valorizarem, ao contrário dos Wheeler, as coisas que crêem
ser mais importantes na vida, como a segurança e estabilidade. Progressivamente
são os amigos dos Wheeler que começam a sentir a claustrofobia do sonho
americano experimentando a ansiedade e a dúvida de estarem provavelmente a
viver uma ilusão pior que a dos Wheeler. Nesta fase é Frank Wheeler quem começa
a racionalizar e a temer todas as dificuldades da mudança. Frank encontra a
desculpa perfeita para a não concretização dos planos de mudança, na promoção
que lhe é oferecida no emprego e na
gravidez não planeada de April. April, por seu lado, sem coragem ela própria
para levar adiante o plano sozinha, culpa Frank pela aniquilação dos seus
sonhos. Segue-se a tragédia.
Para mim o mais perturbante neste filme foi ver retratado um
sentimento comum à maioria dos ocidentais, aquele de que se é especial e de que
se foi destinado a uma vida mais excitante e significativa do que aquela que se
acaba por viver. Mais perturbante ainda foi
ver retratado o processo de racionalização e de desculpas, sobretudo a
si próprio, que a maturidade traz consigo, facilitando a aceitação da gradual
redução de horizontes e da não realização dos sonhos.
CSL
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